05 junho 2006

O Regresso

Lembro-me perfeitamente das eleições presidenciais peruanas de 1989.

Contemporâneas do primeiro escrutínio presidencial brasileiro no pós-64, levaram-me a acompanhar com grande interesse a campanha do escritor Mário Vargas Llosa naquela que parecia ser uma caminhada vitoriosa à presidência e o fim do estilo miserável de fazer política na América Latina. O discurso fluido e racional de Vargas Llosa parecia fadado ao sucesso graças aos anos caóticos que o então candidato-presidente Alan Garcia proporcionara aos peruanos.

Num continente marcado pela incompetência administrativa, pelos discursos demagógicos e o surrealismo na política, Alan Garcia conseguia a façanha de se destacar pela sua catastrófica gestão que juntamente com os terroristas do Sendero Luminoso levara o Peru à beira do caos. Poucas vezes se viu um governo tão incompetente e inconsequente.

Enquanto no Brasil o país era adiado pelas escolhas infelizes de Fernando Collor e Lula da Silva em detrimento de uma esperança chamada Mário Covas, no Peru surgia à última hora uma aberração chamada Alberto Fujimori que sem esconder ao que vinha, conseguiu com um discurso miserável e populista reverter a situação e ganhar as eleições deixando para trás o racionalismo de Vargas Llosa.

Daí para a frente foi o que se viu...

Passados 17 anos o Peru é um país estraçalhado, sem o Sendero Luminoso é certo, mas minado pela corrupção, cheio de cicatrizes da ditadura de «el chino» e com um futuro muito pouco risonho.

Ontem foi a votos.

De um lado Ollanta Humala, um populista autoritário, lugar-tenente de Hugo Chavez , muito ao jeito da nova vaga de líderes «carismáticos» que empurram a América Latina para o atraso, subdesenvolvimento e a violência política. Do outro, Alan Garcia, renascido das trevas e que pousou aqui de candidato racional e garante da democracia. Para trás ficaram as soluções e qualquer sinal de esperança para o Peru.

Venceu Garcia. Dos males o menor.
Dizem.
Talvez seja verdade.

Mas mesmo satisfeito com a derrota de Hugo Chavez e seu cãozinho de estimação, não consigo esboçar um sorriso com o triunfo de Alan Garcia e seu regresso em glória à presidência do país que ajudou a destruir.